6.30.2008

Começo 1 (rascunhos dum pc)

Soa voz familiar, que há tempos não encontrava seus sensores auditivos. Tão familiar que quase doce, quase afago, um carinho sem intenção vindo da alvura de lá, do passado, e dos sonhos, com todas as luzes e aromas, emana duma fugaz bruma, e meio que se concretiza, acariciando antigos delírios.

- alou...

- e ai... - Responde, numa fraternidade arrependida, pensando em seguida: talvez aquele nível de expressão fosse indigno pra demonstrar o que sentia, pouco cordial, seco, sei lá. Logo o desconforto desaparece, pois percebe reciprocidade no som dum riso, e um alívio mutuo voa quilômetros numa parcela ínfima de segundo, reflexo de uma profundidade, de uma cumplicidade que resiste.

Silêncio.

- Pois é... - Diz quem liga.

- Diga. - Quem recebe a ligação.

- Então eu te ligo no sábado, pra gente marcar. -

- Ah... Então você ligou agora só pra saber se esse era realmente o meu número? - Ele Notou. Frustrar-se-ia talvez, esperando na repentina ligação uma longa conversa, quem sabe um desejo que momentaneamente também foi o dela, possivelmente sufocado pela idéia de não poder gastar todos os créditos, ou por qualquer outra racionalidade.

- é... -

- ah... pois é... sou eu...-

Risos. E mais risos, entrecortados com breves silêncios e curtas palavras hesitantes. Como quando lábios se encontram acidentalmente num cumprimento. E o fim da conversa se dá sem que percebam exatamente do que estão falando, brevemente inebriados, de forma que após desligar, não lembrarão exatamente que palavras usaram no fim da conversa. Antes que qualquer idéia eufórica tome o ar e dance como um papagaio, apara num bole, e guarda junto a ela, qualquer expectativa, dentro duma gaveta escura. Tranca.

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6.16.2008

CAPTOU!!!!!!!

Antes de mais nada, antes de tudo, ou antes de qualquer coisa: Depois de uma pergunta escrita é ideal que seja inserido um ponto de interrogação....

...para que seja possível entender que a frase é também uma pergunta. Entende?


Se alguém escreve:

"você recebeu a minha matéria!!!"

E como podem observar, insere três pontos de exclamação, eu imediatamente imagino uma pessoa sem muito equilíbrio mental afirmando histericamente que eu recebi a matéria. Meus ouvidos quase podem doer. E o pior é observar que não existe nenhuma matéria anexada...

Com um grito imaginário daqueles na minha cabeça fiquei quase certo de que eu realmente recebi a matéria...

... Mas ela não aparece anexada, apenas um e-mail, com a representação de uma afirmação histérica, e alguns pedidos de desculpas pelo fato de que a suposta matéria estaria uma porcaria... Realmente... Pode-se dizer, inclusive, que não, não está uma porcaria, por que a matéria simplesmente não está.

Ok... Mando um e-mail em resposta.

NÃO, CACETE!!!! NÃO RECEBIA SUA MATÉRIA!!!!!

Perdão pelas possíveis expressões desagradáveis.

É que exclamações não poderiam pontuar o nível de humor...

... conseguem captar o meu humor?

Beijos e carnes

6.05.2008

Partícula

Acordou assustado, saindo duma confusão interna indescritível, meio que sem saber onde estava, meio que sem saber quem era. Perdido. O quarto em volta estava caótico, não apenas com roupas amassadas espalhadas e objetos fora de lugar, mas móveis mofados, quebrados, e água empossada no chão, fruto de uma goteira ou duas, que apareciam quando chovia forte, bem forte, como naquela noite. O sol invadia o quarto quente e abafado, iluminando fortemente a tudo ali. Fora uma noite de sono pessimamente dormida. Ainda deitado na cama, destravou as janelas e as empurrou para fora, usando os pés. Entrou ar puro, e o cômodo finalmente respirou, as partículas de poeira podiam ser vistas dançando naquele salão desfigurado. Sentou-se vagarosamente. E um sorriso infinito brotou de seu rosto, ainda com olhos serrados, agredidos pela luz, ainda com cabelos esbagaçados e bochechas inchadas. Já sabia quem era e estava em casa. Há pouco tempo, talvez apenas algumas horas, seus dias eram mortos e suas noites, tristes e solitárias, a razão de existir era quase um vulto profundo e desconhecido, a felicidade era um mito, uma mentira, não pensava nisso e, em verdade, fazia tempo que não pensava sobre praticamente nada. Tudo mudava naquele repentino acordar. O mais doce sonho não parafraseava a plenitude que fez nascer aquele sorriso, sentir o desconforto do chão gelado e molhado na planta dos pés era como um divino afago, e o aroma de café que lhe trespassou representava a grandeza de uma explosão de universos, era um sinal que, em si, simbolizava toda a discrepância daquelas horas, tão próximas e de sentidos tão opostos. Ao vislumbrar a cozinha, com o olhar ainda entorpecido, inefáveis expectativas se confirmaram. E eu poderia descrever o quão belo era contemplar o que encontrou, quiçá houvesse respingos de genialidade em minhas veias.